Doce suburbano, jeito de quem vê a vida pelo lado certo. De se encantar com as lembranças da infância: subir em árvore para se esconder da irmã, correr atrás de galinha para rir à toa, jogar pedras no rio para espantar peixes. Fazer bola de meias e traves com par de chinelos para viver o espetáculo do futebol.
Pentear o cabelo molhado, bem repartido do lado direito, ir para escola limpinho e voltar imundo. De ter o direito de dormir sem tomar banho, de todas as noites agradecer a vida boa e farta rezando de mãos dadas com a mãe.
Antes de mergulhar nos sonhos do tempo que se foi, o homem de hoje dá fartas gargalhadas. É de um olhar inquieto, boas falas. Carrega nas costas uma leve tristeza por ter deixado seu velho garoto de castigo, sentado, calado, quieto, no canto oco do coração.
Ele escolheu fazer a alegria dos outros meninos ao contar, recortar e cantar as suas melancólicas histórias encantadas. O palhaço é um sonhador sem esperanças. Um moleque enrugado encantador, que passa os dias sentado no banco empoeirado da praça sem jardim em frente ao seu circo imaginário, esperando com toda a paciência do mundo, pela estreia do maior espetáculo da Terra.
Naquela última noite, o que o velho assistiu foi uma chuva de estrelas.
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